“Para ela está sendo sensacional. Tem tido progresso. Ano passado foi bastante desgastante pois as aulas eram gravadas. Professora maravilhosa, dando conta do recado. Eu como psicanalista e pedagoga estou gostando muito desse novo formato.” Comenta Adriana Patrícia-Mãe de Leticia Fernanda de Oliveira da Costa- 8 anos -4ºano
Um assunto que cada vez mais ganha repercussão é o uso do ensino remoto como paliativo pedagógico diante da atual pandemia que nos assola.
Levando em consideração a minha experiência em salas de aula (reais e virtuais), incluindo a interação com colegas de ofício, relaciono abaixo as principais vantagens e desvantagens do ensino remoto na nossa atual conjuntura.
VANTAGENS
– Aproximou família e escola: antes os professores tinham uma visão pequena de cada ambiente familiar e hoje esta perspectiva se ampliou, as dificuldades das famílias ficaram mais perceptíveis, inclusive saltam aos olhos as que têm interesse real em auxiliar os filhos no aprendizado e as que parecem simplesmente não se importar tanto assim.
– Algumas famílias passaram a “valorizar” mais os professores: diante da dificuldade do suporte pedagógico em casa, alguns pais passaram a enxergar os docentes com outros olhos, até mesmo por estarem acompanhando as aulas com os filhos via MEET (veja bem, falei “algumas famílias”, não a sociedade como um todo e seus respectivos governantes).
– Reciclagem de práticas pedagógicas: diante da nova realidade, os professores se viram obrigados a dominar novos recursos tecnológicos para acompanhar os desafios impostos pela nova realidade.
– Isolamento social: enquanto a vacina não chega, o ensino remoto evita aglomeração, reduzindo assim o contágio por Coronavírus.
Foto: Gabriela Andrade
“No começo foi difícil, mas agora já acostumei. Mantenho a rotina de levantar, me arrumar e colocar o uniforme, arrumar meu quarto e tomar meu café antes de iniciar a aula.
Sinto que hoje tenho que me dedicar mais, pois o professor não está perto para tirar dúvidas, as tarefas aumentaram e online é mais fácil da gente se distrair. Sinto falta das minhas amigas. Mas sei q preciso me proteger e proteger minha família, por isso escolhi continuar estudando de casa. Minha família me dá muito apoio, eu e minhas amigas sempre trocamos dúvidas pelo celular e uma ajuda a outra.” Gabriela Andrade-8º ano-13 anos
DESVANTAGENS
– Dependência da conexão: se a internet não funcionar, adeus aula.
– Aumento de tempo de trabalho: engana-se quem pensa que os professores estão “de férias” em casa. Com o início do ensino remoto, os professores estão trabalhando muito mais do que quando estavam na modalidade presencial, uma vez que as chamadas “horas-atividade” (H.A.) ficaram imperceptíveis para atender tantas demandas diárias.
– Perda de poder aquisitivo: no Paraná, desde a gestão Beto Richa (atualmente Ratinho Júnior), o Governo deve reajuste salarial de acordo com a inflação aos profissionais da Educação. Lembrando que isso não é nenhum luxo, mas um direito, uma vez que se o preço de tudo sobe, o salário tem que acompanhar tal mudança. Se o salário não acompanha, perde-se o poder de compra. Agora com o ensino remoto, gastos como luz e internet estão saindo dos bolsos dos professores (que já estavam prejudicados financeiramente) e não mais do Estado.
– Bur(r)ocracias: ainda no tocante ao Paraná, a Secretaria de Educação, “representada” na figura do secretário Renato Feder, tem feito tortura psicológica com professores, gerando desgaste mental com medidas como a exigência de metas diárias de MEET’s que tendem a acarretar no futuro danos para a coluna e para a vista. No ensino presencial, o professor pode se levantar, andar pela sala enquanto explica, no MEET não. Fora isso, é “aconselhado” que todos fiquem com a câmera ligada durante a aula, o que pode trazer consequências jurídicas futuras como questões ligadas ao Direito de Imagem. E se o aluno se sentir constrangido? Como lidar com a invasão de privacidade dos lares dos alunos? Nem todos os colégios solicitam aos pais a devida permissão no ato da matrícula. Se algum problema jurídico ocorrer, quem vai pagar esta “fatura”? Outra burocracia que não é decorrente do ensino remoto, mas que é burra e que foi facilmente notada, se deu no início do ano letivo quando foi solicitado aos professores o planejamento anual, sendo que este já estava planejadas pela própria Secretaria de Educação no RCO2.0 (Registro de Chamada Online 2.0), caracterizando assim mais um desserviço do que um serviço propriamente dito.
– Defasagem na aprendizagem: muitas crianças desaprenderam a estudar diante da diferença que o ensino remoto impõe em relação ao presencial. O ensino remoto exige uma rotina diferenciada de estudos que depende do aluno e de sua família. No ensino presencial, boa parte desta organização se dava exclusivamente através do professor.
– Abismo social: com o advento da pandemia e consequentemente do ensino remoto, ficou ainda mais evidente as diferenças que dividem a nossa sociedade. Se Educação é um direito de todos, no caso específico do ensino remoto, este direito acaba quando algumas famílias são obrigadas a recorrer ao material impresso nas escolas, sem o devido suporte pedagógico, apenas para cumprir com burocracias pedagógicas como notas e presenças.
– Inchaço educacional: algumas escolas com excesso do contingente de alunos estão cada vez mais abarrotadas em razão do “êxodo” educacional que se estabeleceu na migração de alunos de escolas particulares para públicas, uma vez que estes agora podem estudar em casa. Para os professores, isso gera mais alunos por sala, portanto, mais trabalho e dificuldades. Ao findar da pandemia, as escolas públicas conseguirão lidar com esta demanda? Por mais que alguns alunos voltem para escolas particulares, certamente alguns ficarão, pois a tendência do provisório é se transformar em definitivo.
– Atropelo pedagógico: a falta de organização dos conteúdos é latente. Não existe uma cronologia lógica e os conteúdos parecem que são lançados de “modo aleatório” no Google Classroom. Consideremos Língua Portuguesa sendo trabalhada no terceiro ano do ensino médio, por exemplo. Nesta concepção, alguma aula sobre Modernismo pode brotar ao acaso sem sequer se vislumbrar as Vanguardas Europeias ou mesmo A Semana de Arte Moderna de 22. A terceira geração pode aparecer antes da primeira e assim por diante. Numa aula se trabalha o texto dissertativo-argumentativo e na seguinte o gênero poema. Não que estes conteúdos não sejam importantes, o problema é que simplesmente não há conexão entre eles. Isso sem falar de erros gramaticais gritantes em alguns slides fornecidos pela Secretaria de Educação, além do fato dos professores terem que “se virar nos 30” para abrirem hiperlinks que tornem as aulas um pouco mais palatáveis.
Não existem sistemas educacionais perfeitos, mas nada se compara ao ensino presencial e este só será possível quando professores e alunos forem devidamente vacinados.
O ensino remoto com todas as suas qualidades e deficiências é o que temos para o momento. Se devidamente utilizado pode ser uma benção, mas em longo prazo pode virar uma maldição se seguir pelo viés burocrático que, por sua vez, pode aumentar a carga de trabalho sobre os docentes que já suportam cotidianamente pesos homéricos.
Seja como for, a Educação nunca mais será o mesma. O ensino remoto veio como um terremoto e está mexendo com as estruturas da Educação como um todo. Ele veio para nos tirar “zona de conforto” e isso de modo geral pode ser positivo. Há mudanças que são positivas.
Mas assim como “há males que vêm para o bem”, no nosso país “há bens que vêm para o mal”, uma vez que sempre existem espertalhões oportunistas que se aproveitam do caos para se beneficiar e criar mais problemas do que soluções para os demais. Por hora, só nos resta orar e vigiar.
Foto:Nicole Blanc Hatschbach
“As aulas online estão sendo um pouco desafiadoras, acho que como todos eu também não consigo me concentrar muito bem. Mas no momento é o melhor para todos nós, pois estamos vivendo uma pandemia.” Nicole Blanc Hatschbach-14anos- 1º ensino médio
Prof. Igor Soares Veiga-Professor de Língua Portuguesa nos colégios Estaduais Yvone Pimentel e Emílio de Menezes.
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